segunda-feira, 13 de junho de 2016

Orlando, as armas de assalto e os seus ferimentos

Por David Langness.


Durante os catorze meses que estive na guerra do Vietname, vi os ferimentos horríveis que as armas de assalto fazem.

Assim, hoje farei orações fervorosas pela recuperação muito difícil das 53 pessoas hospitalizadas em Orlando, Florida, que têm esses tipos de ferimentos. Vou orar também pelos médicos que têm de tratar esses ferimentos graves.

Infelizmente, a maior parte da cobertura mediática sobre a controvérsia das armas de assalto incide sobre as próprias armas, e não sobre os ferimentos que os seus projécteis causam. O recente ataque mortal em Orlando irá, sem dúvida, reacender o debate recorrente nos Estados Unidos sobre a proibição de armas de assalto; mas antes de tomar uma posição sobre o assunto, talvez lhe interesse saber alguma informação adicional que poderá desconhecer.

Esta informação, mesmo que sendo completamente factual, é difícil de digerir. Algumas pessoas ficarão impressionadas; por isso, se é sensível, não continue a ler.

Quando uma arma de assalto de estilo militar dispara o seu carregador circular, a bala é projectada mais rápido e mais longe do que a maioria das outras armas. As balas de armas automáticas AK-47 Kalashnikov chinesa ou de uma M16A1 ou A2 americana - os tipos mais comuns - foram concebidas para produzir altas velocidades de disparo, mas também foram projectadas para rasgar o tecido humano de uma forma única. Em vez de produzir um ferimento de entrada e saída ("through-and-through") - basicamente um orifício em forma de tubo com pequeno diâmetro, nos músculos, ossos ou órgãos - as balas de armas de assalto têm o que balística e médicos especialistas chamam "efeito de guinada". Isso significa que a bala foi concebida para "estraçalhar" ou destruir o corpo atingido, produzindo uma pequena ferida de entrada, mas a criando no corpo uma grande cavidade como ferimento de saída.

É assim que funciona: a bala de uma arma de assalto entra no tecido humano, penetrando 12 centímetros, amolgando-se e desfazendo-se antes de guinar 90ᵒ. Seguidamente, a secção traseira da bala fragmenta-se no corpo, como se fosse uma granada. Esses fragmentos penetram ainda mais no corpo, cerca de 7 cm num padrão circular. Depois, a bala e os seus muitos fragmentos saem do corpo, fazendo um buraco muito maior e mais irregular do que na entrada. Este efeito de guinada, amolgamento e fragmentação - que não ocorre com os revólveres ou espingardas normais usados para a caça - cria ferimentos de saída enormes e assustadores, o que naturalmente mata as vítimas com muito mais frequência do que faz uma arma normal não-militar.

Podemos visualizar o efeito desta maneira: o trajecto destrutivo de uma bala de arma de assalto cria, quando visto de lado, algo semelhante a um cone em vez de um tubo. Podemos imaginar o que isso faz a um corpo humano frágil.

Podemos não gostar de admitir, mas o objectivo principal de armas de assalto militares e das suas balas é produzir a maior carnificina e morte possíveis. Na minha opinião, uma arma de assalto não tem nenhuma utilização alternativa real; é feita para matar seres humanos, e não para ser usada como arma de caça. Uma bala normal atravessa o corpo humano ou animal, produzindo uma saída ferida não muito maior do que o orifício de entrada. Mas a bala de uma arma de assalto destrói a maior quantidade de tecido possível, tornando a morte por ferimento muito mais provável. Quando médicos e enfermeiros tentam curar essas feridas, percebem que são tremendamente mais difíceis de tratar e recuperar, porque fizeram um enorme estrago. Perguntem-me como é que eu sei.

Nos Estados Unidos, apesar das sondagens revelarem que cerca de três quartos da população apoiaria uma proibição total de armas de assalto de estilo militar, estas encontram-se disponíveis para venda e posse legal em quase todos os Estados. Hoje, após o massacre de Orlando, o presidente dos Estados Unidos afirmou: "Temos de decidir se esse é o tipo de país que queremos ser".

Os ensinamentos Bahá'ís designam estas armas de guerra - feitas exclusivamente para aniquilar outros seres humanos - "os frutos malignos da civilização material:"
Considerai! Estes navios de guerra que reduzem uma cidade a ruínas, no espaço de uma hora são o resultado da civilização material; da mesma forma, os canhões Krupp, as espingardas Mauser, a dinamite, os submarinos, os torpedeiros, os aviões armados e os bombardeiros - todas essas armas de guerra são os frutos malignos da civilização material. Se a civilização material tivesse sido combinada com a civilização divina, estas armas de fogo nunca teriam sido inventadas. Não, pelo contrário; a energia humana teria sido inteiramente dedicada a invenções úteis e ter-se-ia concentrado em descobertas louváveis. A civilização material é como uma lâmpada de vidro. A civilização divina é a própria lâmpada e o vidro sem a luz é escuro. A civilização material é como o corpo. Não importa o quão infinitamente gracioso, elegante e belo ele seja; ele está morto. A civilização divina é como o espírito, e o corpo obtém a sua vida do espírito; caso contrário torna-se um cadáver. ('Abdu'l-Bahá, Selections from the Writings of Abdu’l-Baha, p. 303)
Os Bahá’ís apoiam a proibição da posse de armas de assalto de estilo militar por civis? Os Bahá’ís olham para a questão de uma perspectiva diferente, mais macroscópica; na verdade, em vez de simplesmente proibir as armas, os ensinamentos Bahá'ís pretendem transformar a sociedade em geral, que condena o seu uso. Em vez de um tratamento dos sintomas, os Bahá’ís querem curar totalmente a doença. Queremos criar uma cultura global pacífica, harmoniosa e unida. Os Bahá’ís querem combinar a civilização material com a civilização divina, e inculcar os valores espirituais que Bahá'u'lláh ensinou a todos os povos.

Os ensinamentos Bahá’ís dizem que se não conseguirmos fazer isso, iremos apenas enfrentar mais do mesmo:
A escuridão da noite encobriu todas as regiões, e toda a Terra se encontra velada por nuvens densas. Os povos do mundo estão submersos nas profundezas obscuras de ilusões vãs, enquanto os seus tiranos nadam em crueldade e ódio. Nada vejo salvo o clarão dos fogos devoradores e ardentes que se erguem nos abismos mais profundos; Nada ouço salvo o estrondo ameaçador do ribombar de milhares e milhares de armas de ataque impetuosas, enquanto toda a terra brada, em voz alta, na sua língua secreta: "As minhas riquezas de nada me valem e minha soberania pereceu!" ('Abdu'l-Bahá, Selections from the Writings of Abdu’l-Baha, p. 272)

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Texto original: Orlando, Assault Weapons and “Yaw” (www.bahaiteachings.org)

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David Langness é jornalista e crítico de literatura na revista Paste. É também editor e autor do site bahaiteachings.org. Vive em Sierra Foothills, California, EUA.

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