sexta-feira, 14 de abril de 2017

O Mistério da Páscoa e o Túmulo Vazio

Por David Langness.

Ressuscitou ao terceiro dia conforme as Escrituras… (Credo Niceno)

E, se Cristo não ressuscitou, é vã a vossa fé… (1 Coríntios 15:17)
Quem viveu a infância numa cultura Cristã lembra-se da magia e do mistério da Páscoa - os ovos de Páscoa, o coelho da Páscoa, as cerimónias na igreja ao nascer do sol e principalmente o conceito misterioso do Cristo ressuscitado dos mortos após três dias no túmulo.

Este evento milagroso - a ressurreição de Cristo após a sua crucificação - enchia-me de admiração quando era criança. Aceitava isso tal como as crianças em qualquer lugar acreditam no que lhes dizem e maravilham-se com a sua fantástica improbabilidade. Mas à medida que crescia e aprendia um pouco sobre ciência e razão, comecei a questionar seriamente este milagre. Como é que alguém podia morrer, e voltar novamente a viver? Parecia impossível.

E nos meus doze anos, quando era um rapaz curioso e conflituoso, comecei num projecto pessoal de Páscoa. Fui à biblioteca e procurei livros. Pedi à minha amiga, a Sra. Weston, a simpática e amável bibliotecária da nossa pequena cidade, para me mostrar onde é que eu podia saber mais coisas sobre a Páscoa. Ela acedeu, e o que eu aprendi deixou-me espantado.

 Estátua de Astaroth /Astarte
A Páscoa, em resumo, começou por ser um feriado que celebrava a chegada da primavera, a fertilidade e o amanhecer, tudo exemplificado por Eostre, a grande deusa-mãe do povo saxão no norte da Inglaterra. O seu nome veio da palavra arcaica para primavera: eastre. Compreendi que em todo o mundo antigo, existiam deusas semelhantes para a primavera e a fecundidade, e que eram conhecidas por outros nomes: Afrodite, em Roma; Astaroth, no antigo Israel; Astarte da antiga Grécia; Hator no Egipto; Istar da Assíria; Kali da Índia; Ostara, a deusa nórdica da fertilidade; e Vesta das regiões eslavas.

Então, perguntei à Sra. Weston, como é que esse nome se tornou um dia santo cristão? Ela mostrou-me uma tradução de um livro intitulado Mitologia Alemã de Jacob Grimm - que eu conhecia porque eu tinha lido uma colectânea de mitos e contos populares que ele e o seu irmão tinham reunido. Isto era o que Jacob Grimm tinha a dizer sobre Eostre:
Ostara, Eástre parece, portanto, ter sido a divindade do amanhecer radiante, da luz emergente, um espectáculo que traz alegria e bênçãos, cujo significado poderia ser facilmente adaptado ao dia da ressurreição do Deus cristão. As fogueiras acendiam-se na Páscoa e, de acordo com a antiga crença popular, no momento em que o sol nascia na manhã de domingo de Páscoa, ela dava três saltos de alegria e dançava de felicidade... Esta Ostara na religião pagã, como a [anglo-saxónica] Eástre, devia simbolizar um ser superior, cuja adoração estava tão firmemente enraizada, que os mestres cristãos toleraram o nome e aplicaram-no a um de seus próprios mais grandiosos aniversários. (Deutsche Mythologie, 1835)
Por fim, descobri que quando a expansão do cristianismo da terra santa para o Ocidente, chegou aos povos anglo-saxões, os líderes da igreja simplesmente adaptaram o nome, os símbolos e as tradições das suas celebrações locais, a fim de deixar os cristãos convertidos mais confortáveis com a sua nova religião,

Aprender tudo isso fez-me rejeitar toda a ideia da Páscoa. Tal como uma criança que descobre a verdade sobre o Pai Natal, senti-me, de certa forma, enganado. Quando investiguei um pouco mais sobre o milagre da ressurreição de Cristo, comecei a suspeitar que a Igreja também tinha simplesmente adaptado e embelezado este conto, tornando o milagroso túmulo vazio de Cristo num artigo de fé, em vez de algo real.

Foi só quando me tornei Bahá’í, mais tarde na minha adolescência, que comecei a entender o verdadeiro significado da Páscoa:
A ressurreição da Manifestante de Deus não é do corpo. Tudo o que lhes diz respeito - todas as Suas situações e condições, tudo o que Eles fazem, estabelecem, ensinam, interpretam, ilustram e instruem - é de carácter místico e espiritual e não pertence ao reino da materialidade.

Esse é o caso do Cristo vindo do céu... uma vez que está estabelecido que Cristo veio do céu espiritual do Reino divino, o Seu desaparecimento na terra durante três dias também deve ter um significado místico em vez de literal. Da mesma maneira, a Sua ressurreição do seio da terra é um assunto místico e expressa uma condição espiritual e não material. E a Sua ascensão ao céu, da mesma forma, é espiritual e não de natureza material.

... Após o martírio de Cristo, os Apóstolos ficaram perplexos e assustados. A realidade de Cristo, que consiste nos Seus ensinamentos, nas Suas bênçãos, nas Suas perfeições e no Seu poder espiritual, ficou oculta e desapareceu durante dois ou três dias após o Seu martírio, e não teve aparecimento ou manifestação externa - de facto, era como se estivesse totalmente perdida. Pois aqueles que verdadeiramente acreditavam eram poucos em número, e mesmo esses estavam perplexos e assustados. A Causa de Cristo era, pois, como um corpo sem vida. Após três dias, os Apóstolos tornaram-se firmes e decididos, levantaram-se para ajudar a Causa de Cristo, resolveram promover os ensinamentos divinos e praticar os conselhos do seu Senhor, e esforçaram-se por servi-Lo. Então a realidade de Cristo tornou-se resplandecente, a Sua graça brilhou, a Sua religião encontrou uma nova vida, e os Seus ensinamentos e conselhos tornaram-se manifestos e visíveis. Por outras palavras, a Causa de Cristo, que era como um corpo sem vida, despertou para a vida e ficou rodeada pela graça do Espírito Santo.

Este é o significado da ressurreição de Cristo, e esta foi uma verdadeira ressurreição. Mas como o clero não entendeu o significado dos Evangelhos e não compreendeu esse mistério, tem sido afirmado que a religião se opõe à ciência, pois, entre outras coisas, a ascensão de Cristo num corpo físico aos céus materiais é contrária à Ciências matemáticas. Mas quando a verdade deste assunto é exposta e este símbolo é explicado, ela não está de modo algum em contradição com a ciência, mas antes, está confirmada pela ciência e pela razão. (Abdu'l-Baha, Some Answered Questions, newly revised edition, pp. 117-119)

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Texto original: The Mystery of Easter and Christ’s Empty Tomb (www.bahaiteachings.org)

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David Langness é jornalista e crítico de literatura na revista Paste. É também editor e autor do site bahaiteachings.org. Vive em Sierra Foothills, California, EUA.

1 comentário:

Janete Argenton disse...

maravilhosa explicação sempre entendi igualmente desta forma